Uma luta travada na caneta. Pesquisa da FCM aborda saúde, doença e cuidado na perspectiva dxs academicxs indígenas da Unicamp
Publicado por: Camila Delmondes
17 de dezembro de 2021

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Texto: Marcelo Oliveira e Camila Delmondes

Na última semana de novembro, o Laboratório de Práticas Alternativas, Complementares e Integrativas em Saúde (Lapacis) da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp lançou o projeto de pesquisa denominado Saúde, doença e cuidado na perspectiva dxs alunxs indígenas ingressantes nos cursos de graduação da Universidade Estadual de Campinas. A iniciativa inédita, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) foi anunciada em encontro remoto transmitido ao vivo pelo Canal da FCM, no Youtube.

Assista o evento na íntegra.

O encontro, conduzido pelo coordenador do Lapacis, Nelson Felice de Barros, contou com a participação do diretor da FCM, Luiz Carlos Zeferino; do doutor em Antropologia Indígena e fundador do Centro de Medicina Indígena de Manaus, João Paulo de Lima Barreto Tucano; da coordenadora do Serviço de Apoio ao Estudante (SAE) da Unicamp, Mariana de Freitas Neri; da representante da Comissão Assessora para Inclusão Acadêmica e Participação dos Povos Indígenas (Caiapi) da Diretoria Executiva de Direitos Humanos (DEDH) da Unicamp, Joceli Rimoli; e da estudante do segundo ano de graduação em Ciências Sociais da Unicamp e representante do Diretório Central dos Estudantes Indígenas, Marcela Torres Pankararu.

Segundo explicou Nelson Filice de Barros, a partir das primeiras edições do vestibular indígena da Unicamp, em 2018, as fronteiras interculturais do meio acadêmico foram expandidas. De acordo com o pesquisador, o confronto nos modelos de pensar, vivenciar, significar e ressignificar os sentidos atribuídos ao processo de saúde, doença e cuidado – trouxe à tona a necessidade de compreender, de forma mais efetiva, a dinâmica desse processo a partir da perspectiva indígena, tendo em vista o acesso integral dessa população à Saúde, garantida pela Política Nacional de Atenção dos Povos Indígenas.

“Desde 2018, passamos a discutir a possibilidades de configuração de uma diáspora indígena para Unicamp, com a reunião de etnias provenientes de diferentes lugares do país, aldeados ou não, que estão vivendo e compartilhando as suas experiências e histórias de vida na Universidade”, contextualizou Barros sobre os pilares de sustentação de seu estudo.

O antropólogo Paulo de Lima Barreto Tucano falou sobre a importância da oralidade para os indígenas. “Construímos o nosso conhecimento e as nossas relações pela palavra, e pelo empenho da palavra. Palavra para nós é objetivo. Assim como o bisturi serve ao médico para cortar o corpo, é a palavra para o indígena. A palavra corta o corpo. E o corpo é microcosmo, a síntese de todos os elementos que existem e que com ele estabelecem uma teia de relações cosmopolíticas, políticas, econômicas e sociais”, disse.

Barreto falou, também, sobre o importante papel da Unicamp de reconhecer e valorizar a responsabilidade e a contribuição dos acadêmicos indígenas em trazer e discutir os conceitos indígenas dentro da Universidade. “Os povos indígenas sempre foram vistos como não detentores do conhecimento, como aqueles que não têm ciência ou tecnologia. Os povos indígenas, assim como outros povos, foram julgados pela falta das coisas, pelo ponto de vista do colonizador”, criticou.

A coordenadora do SAE Unicamp, Mariana de Freitas Neri compartilhou as dificuldades enfrentadas no contexto da instituição, tendo em vista o intercâmbio cultural. “A grande maioria dos professores, infelizmente, espera que os indígenas se adaptem à Academia. Poucos estão abertos à flexibilização. A interação cultural ainda está mais na teoria que na prática”, observou.

O serviço de assistência social foi destacado por Neri como fundamental à permanência dos acadêmicos indígenas na universidade. “Os assistentes sociais do SAE realizam um trabalho muito próximo a esses estudantes e acabam se tornando seus verdadeiros pilares na instituição”, comentou.

Joceli Rimoli, representante da Caiapi, enalteceu o trabalho de construção de redes de apoio aos acadêmicos indígenas, na Unicamp. “A coisa mais linda e que me encanta em trabalhar nesta causa, no acolhimento e contribuir para o acesso do estudante indígena, é saber que foram constituídas redes muito solidárias. Existem redes nos campi de Campinas e Limeira, e redes que se interconectam com movimentos sociais indígenas”, destacou.

Uma luta travada na caneta! Assim definiu a estudante do curso de Ciências Sociais e representante do Diretório Central dos Estudantes Indígenas da Unicamp, Marcela Panakararu, sobre o acesso dos estudantes indígenas à Universidade. “A gente se prepara muito. E a universidade também tem que se preparar para nos receber. São acadêmicxs indígenas oriundos de diversas etnias e diversas partes do Brasil”, frisou.

“O lançamento desse projeto é um novo ciclo que se inicia. Nele, teremos a oportunidade de transferir conhecimento e também aprender com os povos indígenas”, disse o diretor da FCM, Luiz Carlos Zeferino, em apoio à iniciativa coordenada pelo professor Nelson Filice de Barros, através do Lapacis.



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