Ser médico ou cientista, eis a questão. Na dúvida, por que não os dois?
Publicado por: Camila Delmondes
07 de outubro de 2015

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Angelo Brito e Guilherme Rossi são jovens, talentosos e inteligentes. Escolheram uma das profissões mais cobiçadas e valorizadas na atualidade: a medicina. Seus ídolos são o inventor Thomas Edison, o evolucionista Charles Darwin, o gênio Leonardo Da Vinci, os médicos Paulo Vansolini, Leopoldo de Meis, Rudolph Virchow e José Lopes de Faria – algo inusitado para quem tem apenas 22 anos de idade. Um sonho eles têm em comum: ser cientista e descobrir a cura do câncer. Não à toa, ambos desenvolvem pesquisas nessa área.

Guilherme procura moléculas chamadas de microRNAs que intermedeiam a ação da quimioterapia e o desenvolvimento do câncer nos casos chamados de indolentes – que não respondem ao tratamento. Angelo busca descobrir os caminhos que levam ao desenvolvimento de novos vasos para a nutrição do tumor, processo conhecido por angiogênese, mas na área de leucemia.

O incentivo para a pesquisa começou na graduação – já no primeiro ano do curso de medicina – e levou-os para dentro de vários laboratórios de pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. A visão romântica do que é ser cientista começou a ruir em meio a tantos processos, livros, artigos e técnicas que tiveram que aprender. As dificuldades, no entanto, só fizeram aumentar ainda mais o desejo de seguir uma carreira diferente e pouco conhecida: a de médico-pesquisador.

No quarto ano do curso de medicina, ambos trancaram a graduação e decidiram iniciar uma nova jornada com direito a diploma de doutorado, oferecido pelo Programa Médico-Pesquisador da FCM da Unicamp. Uma guinada e tanto na vida de quem até então ‘andava com a turma’, seguia calendários, provas e tinha uma rotina de aulas preestabelecida.

“Da noite para o dia, você deixa de ser o aluno de medicina e passa a ser aluno de pós e tem que aprender a lidar com a liberdade e a fazer tudo sozinho. É um choque de realidade. Você fica maduro, independente e até mais humilde”, diz Angelo Brito que é o primeiro aluno a ingressar no Programa Médico-Pesquisador, conhecido como MD-PhD.

Guilherme Rossi começa o MD-PhD em 2014 já considerando a experiência do amigo e sabe que tudo vai depender dele daqui para frente. Por dois anos, ele vai se dedicar ao sonho de criança. Após esse período, ele volta para a graduação e conclui o curso de medicina. Em oito anos – seis de graduação e dois de pós – ele fecha um ciclo de estudos que normalmente seria de 12 anos ou mais, se escolhesse fazer residência-médica primeiro.

“O pesquisador é aquele que está na fronteira do conhecimento, procurando descobrir algo que ajude os outros. O jovem tem a mente aberta e mais pique para ler, participar de congressos e grupos de pesquisa. Quanto antes começar a pós, melhor. Eu quero aprender e ensinar”, revelou Guilherme.

Segundo o coordenador da pós-graduação da FCM, Licio Augusto Velloso, o Programa Médico-Pesquisador é para poucos. Pelos menos 95% dos alunos querem ser médicos com atuação clínico-cirúrgica e apenas entre um a três alunos, por turma, tem o perfil voltado para a atividade médica de pesquisa. Para esses alunos, a FCM criou o Programa Médico-Pesquisador, em 2010, na administração do professor José Antonio Rocha Gontijo e do diretor-associado Gil Guerra-Júnior. O modelo é similar ao norte-americano. No Brasil, apenas a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) oferece o curso há trinta anos. A Escola Paulista de Medicina tem uma modalidade um pouco diferente. A Unicamp, portanto, é a terceira.

“O MD PhD é para aquele aluno que gosta de medicina, mas que tem um pergunta a mais: como a doença se desenvolve ou como melhorar o tratamento. E só tem um jeito de responder: pesquisando”, disse Velloso.

A cada ano são oferecidas duas vagas. O orientador de iniciação científica é quem identifica o aluno que tem potencial, “aquele que vem à noite, aos finais de  semana e trabalha mais que a média”. Mas tem a parte do aluno interessado, que deve se candidatar, preparar o memorial, não ter reprovação na graduação e escrever um projeto de pesquisa. A última etapa é a entrevista.

“O Programa é uma estratégia administrativa da FCM para melhorar aquilo que ela já oferece de bom. Estamos abrindo caminho para formar melhores médicos-pesquisadores. No futuro, isso irá repercutir positivamente”, disse Velloso.

Uma coisa Angelo e Guilherme sabem: não querem ficar atrás de uma mesa de consultório ou fazer residência médica, o que é a tendência natural da carreira de médico. Ambos querem estar na Universidade, produzindo conhecimento novo e, quem sabe, dando aula para novos alunos.

“Eu decidi que seria melhor investir na pós-graduação. Tem que querer. A gente supera as dificuldades. Quero, um dia, ser professor e pesquisador aqui na FCM”, revela Guilherme.

“Pode ser que eu passe 40 anos estudando o câncer e não chegue a uma descoberta que vai ser capa de revista ou capítulo de livro, mas se eu construir nem que seja uma frase, terei contribuído muito para o conhecimento e isso vale a pena”, disse Angelo.

Fotos: Marcelo Oliveira - CADCC/FCM-Unicamp



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