Internacional: O papel da Terapia Médica Otimizada no tratamento da Doença Arterial Coronariana
Publicado por: Camila Delmondes
04 de junho de 2019

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O foco da comunidade médica, nos últimos anos, tem sido a busca por melhores resultados do método de Intervenção Coronária Percutânea (ICP) para o tratamento de pacientes com Doença Arterial Coronariana (DAC). Recentemente, novos estudos mostram como o cuidado pós-cirúrgico tem sido fator-chave na recuperação dos pacientes em tempo cada vez mais curto.

Dados comparados de dois ensaios clínicos, realizados entre 2005 e 2014, publicados recentemente em um artigo no Journal of the American College of Cardiology (JACC) – a revista científica de maior impacto atualmente na área de cardiologia – mostraram que os pacientes submetidos à Cirurgia de Revascularização do Miocárdio (CRM), no caso do ensaio mais recente (EXCEL), tiveram um risco significativamente menor de desfecho composto por morte por todas as causas, infarto agudo do miocárdio, derrame ou revascularização guiada por avaliação de isquemia – quando comparados aos pacientes do ensaio mais antigo (SYNTAX), submetidos à Cirurgia de Revascularização Coronária (CABG, da sigla em inglês para Coronary Artery Bypass Graf).

“A Terapia Médica Otimizada (TMO) ou Terapia Médica Orientada por Diretrizes (TMOD), foi muito superior nos pacientes do estudo EXCEL, tanto para os períodos de menor acompanhamento (30 dias), como para os períodos de acompanhamento mais longo (três anos), fator que pode ajudar a explicar a grande diminuição no risco de eventos cardiovasculares em relação ao que foi observado no estudo SYNTAX”, comentou o médico cardiologista da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, Rodrigo Modolo, que atualmente realiza estágio pós-doutorado na Holanda, junto ao professor Patrick W. Serruys.

Pesquisador sênior do Imperial College (Londres, Inglaterra), Patrick W. Serruys também enfatiza a importância da TMOD após o procedimento de revascularização do tronco da artéria coronária esquerda. “A prevenção secundária é algo que deve ser enfatizado tanto na ICP, quanto na CRM”.

O estudo EXCEL comparou o método de ICP com o de CRM no tratamento das lesões não protegidas no Tronco de Coronária Esquerda (TCE), em aproximadamente 1.900 pacientes, de baixo a médio risco. A análise mostrou que, assim como no tratamento cirúrgico, o método percutâneo apresentava taxas comparáveis de risco de morte, acidente vascular cerebral ou infarto do miocárdio, em três anos.

Por sua vez, o ensaio SINTAX acompanhou pacientes com Doença do TCE ou Doença de 3 vasos. O resultado em cinco anos sugeria menor risco de morte entre os pacientes com doença de TCE com baixo SYNTAX score submetidos à ICP, e melhores resultados cirúrgicos entre os pacientes de maior SYNTAX score.

Na análise publicada no JACC, os pesquisadores buscaram verificar melhores resultados clínicos dos pacientes submetidos à CRM para o tratamento da doença do TCE, em relação aos obtidos nos ensaios SYNTAX e EXCEL, tendo em vista a evolução desse procedimento cirúrgico na última década. “Considerando que à época de realização do SYNTAX ainda utilizávamos o stent da marca Taxus, com hastes bastante espessas, fica evidente, na atualidade, uma melhora considerável nas intervenções percutâneas, entretanto, ainda é preciso mais evidências no que se refere ao procedimento cirúrgico”.

O porquê das melhorias

A análise combinada proposta no novo estudo cruzou os dados de 329 pacientes do SYNTAX e 580 pacientes do EXCEL, submetidos à CRM. Até os primeiros 30 dias de acompanhamento, não houve diferença significativa entre ambos os grupos, quanto ao risco de eventos cardiovasculares, como infarto agudo do miocárdio, derrame ou revascularização.

No entanto, ao final de três anos de monitoramento, as taxas de Eventos Cardiovasculares Adversos (MACE, da sigla em inglês para Major Adverse Cardiac Events) variaram de 20,9%, nos pacientes SYNTAX, para 14,0%, nos pacientes EXCEL (P=0,008). O risco de morte, acidente vascular cerebral ou infarto do miocárdio, ao final desse período, também foi maior nos pacientes SYNTAX (14,0% vs 9,6%; P = 0,05). Aos 3 anos, ainda que não significativa, houve uma tendência de mortalidade mais baixa no EXCEL (5,5%), em relação ao SYNTAX (8,5%).

Enquanto a duração do bypass, do clampeamento cruzado e do procedimento cirúrgico em si foram semelhantes entre os grupos de pacientes, 29,6% das cirurgias, no EXCEL, foram realizadas sem Circulação Extracorpórea (CEC). No SYNTAX apenas 15,4% dessas cirurgias aconteceram sem CEC.

O uso da Artéria Mamária Interna Esquerda (AMIE) e da artéria radial como enxertos foram mais frequentes no SINTAX do que no EXCEL, mas não houve diferença no número de enxertos arteriais ou venosos ou no uso de AMIEs bilaterais. Os enxertos de AMIEs foram usados em mais de 97% dos pacientes em SYNTAX e quase 99% daqueles em EXCEL (P = 0,08).

A despeito dos dados do SYNTAX e EXCEL que comprovam os avanços dos resultados cirúrgicos, ainda não é possível apontar, com segurança, o fator diretamente responsável por tais melhorias. “É claro, temos algumas diferenças nas técnicas cirúrgicas. Por exemplo, temos quase o dobro do número de pacientes submetidos à cirurgia sem CEC (no EXCEL), mas ainda há um intenso debate sobre esse tipo de cirurgia ser melhor do que cirurgia com CEC. O que temos agora é o desconhecido. Os dados que temos não nos permite dizer "sem CEC o resultado é melhor”, apesar da grande quantidade de CRMs sem CEC, evidenciadas no EXCEL”.

Por outro lado, o uso da TMOD foi mais exitoso no EXCEL, com maior uso de agentes antiplaquetários, drogas hipolipemiantes, para o controle dos níveis de colesterol, e betabloqueadores, para o controle da frequência cardíaca e pressão arterial. Nesse contexto, por exemplo, mais de 90% dos pacientes do EXCEL receberam prescrição de estatina (hipolipemiante), em comparação com 75% dos pacientes do SYNTAX.

Benefício não explicado da Cirurgia ‘Off-pump’

De acordo com o cirurgião Subodh Verma, da Universidade de Toronto (Canadá), os resultados clínicos das CRMs para o tratamento da doença do TCE melhoraram com o tempo e são bons para os pacientes. “Seja por causa da cirurgia, farmacoterapia ou sistemas de tratamento, vemos que ao longo do tempo há uma melhora na sobrevida global das pessoas submetidas à cirurgia de revascularização miocárdica para pacientes do doença de tronco da coronária esquerda”.

O pesquisador disse não acreditar que muitos avanços nas técnicas de CABG tenham ocorrido entre a realização do SYNTAX e do EXCEL. Enquanto mais procedimentos sem CEC foram realizados, os resultados de cinco anos do trial CORONARY mostraram nenhuma diferença significativa no riso de morte, acidente vascular cerebral, infarto do miocárdio, insuficiência renal ou revascularização com ou sem circulação extracorpórea. O uso de diferentes condutos para revascularização também não é suficiente para explicar a diferença.

Assim como Modolo e Serruys, Verma acredita que uma maior adesão à farmacoterapia médica ajuda a explicar a melhora dos resultados observados no EXCEL. "Sabemos que todas essas terapias farmacológicas melhoram os resultados, inclusive os resultados de longo prazo", disse ele. "Isso está representado nos dados." Os resultados clínicos para a CABG em geral são excelentes, mas as taxas de eventos adversos entre o SYNTAX e o EXCEL são bastante semelhantes no interstício dos primeiros 30 dias de acompanhamento, observou o pesquisador. "Esse é um indício de que a farmacoterapia desempenha um papel muito importante na redução das taxas de MACE".

Em um editorial, o médico cirurgião da Northwestern University, Patrick McCarthy, reconhece a contribuição de ambos os estudos no uso rotineiro de enxertos arteriais e venosos, concordando com os pares de academia de que a TMOD deve ser prescrita após a cirurgia de revascularização miocárdica para "retardar a natureza progressiva da aterosclerose, manter a permeabilidade do enxerto e reduzir a pressão arterial".

De acordo com Patrick Serruys, a equipe de pesquisadores deve seguir a evolução clínica dos pacientes do EXCEL, pelo menos, por mais 10 anos, enquanto trabalham mais próximos da indústria para gerar dados de acompanhamento de longo prazo.


Entrevista publicada em abril de 2019, no site TCTMD, veículo de comunicação da Cardiovascular Research Foundation (CRF)
Texto original: Michael O'Riordan
Tradução: Camila Delmondes e Rodrigo Modolo



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